Este deve ser 1º caso em MS que cirurgia ocorre por meio de judicialização (crédito da foto: banco de imagens)
Texto: Matheus Teixeira
Com atuação em uma causa inédita, a Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul conseguiu na Justiça que uma mulher trans tenha o direito de realizar de graça uma cirurgia de feminização facial – para tornar seu rosto mais delicado. É provável que em âmbito estadual este seja o 1º caso em que a conquista dessa cirurgia venha por meio de uma judicialização.
O defensor público titular da 4ª Defensoria Pública de Atenção à Saúde e responsável pela petição inicial, Nilton Marcelo de Camargo, frisa que esse torna-se um relevante precedente judicial para uma temática tão sensível. “A feminização facial ainda não integra o rol de procedimentos cirúrgicos cobertos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Por outro lado, o sofrimento psíquico e a saúde mental de alguém não podem estar sujeitos a agravo”, defende. Deste modo, por ordem judicial a paciente será encaminhada ao serviço privado e o pagamento na íntegra deverá ser feito pelo governo estadual.
Helena (os sobrenomes não são divulgados a pedido da entrevistada), 56, assistida pela Defensoria Estadual, nasceu em um corpo masculino. Entretanto, sempre se reconheceu no universo oposto: o feminino; por isso, sua identidade de gênero é transgênero – ou seja, Helena é uma mulher transgênero, ainda que até o momento não tenha passado pela cirurgia de transgenitalização (reafirmação de gênero ou readequação genital) para a construção de uma neovagina, o que pretende fazer no ano que vem.
A assistida também deseja passar pela feminização, que não é considerada uma cirurgia estética, porque sente que mulheres trans com aparências um tanto quanto masculinas sofrem mais transfobia. “Essa cirurgia é importante para poder ter uma característica feminina e ser mais bonita e mais feliz! Para quando tirar fotos para documentos e estiver vestida de mulher em algum local não ser confundida com um homem”, expõe Helena.
O conjunto de procedimentos cirúrgicos a que será submetida na feminização facial engloba diminuir a testa, reduzir a distância entre o nariz e o lábio superior, remover parcialmente o pomo-de-adão e uma cirurgia plástica no nariz. De acordo com médicos especialistas, os resultados finais não serão totalmente imediatos e alguns podem levar até dois anos para serem atingidos. Mesmo que esses benefícios sejam gradativos, Helena diz que será “um sonho muito grande” conseguir suavizar os traços de seu rosto.
Defensor Nilton Camargo explica que essa cirurgia ainda não faz parte do rol do SUS (crédito da foto: Matheus Teixeira)
A decisão judicial
Ao procurar a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, por ser de baixa renda e não ter plano de saúde suplementar, Helena manifestou ao defensor a necessidade de conseguir a feminização facial, já que passa por acompanhamento médico periódico para efetivar a sua transição de gênero. Então, a fim de atender à demanda, o defensor público propôs uma ação com o objetivo de obrigar o Estado a pagar a cirurgia rapidamente.
Para efetivar esse direito, a liminar foi concedida pelo Poder Judiciário. E como o SUS não realiza feminização facial até o momento, Helena será operada em uma clínica médica particular na cidade de São Paulo. O agendamento da cirurgia deve ocorrer em até 30 dias úteis, a contar a partir de 8 de novembro, e ser concretizada, no máximo, em mais 30 dias úteis.
“Muitas pessoas estão seguras em seu propósito de transexualização, mas não o realizam porque o condicionam a prévia realização de cirurgia de feminilização facial. Por tudo isso, essa decisão judicial representa uma porta que se abre para a concretização do direito à saúde e ao direito cultural dessa minoria”, comenta o defensor de Atenção à Saúde.