Texto: Danielle Valentim
Celebrado em 19 de abril, o Dia dos Povos Indígenas relembra a importância e a diversidade dos povos originários. Mas, neste dia de homenagens, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, por meio do Núcleo de Defesa dos Povos Indígenas e da Igualdade Racial e Étnica (Nupiir), também destaca a resistência desta população diante de todas as adversidades e os reflexos do trabalho presencial dentro das comunidades indígenas de todo o Estado.
O coordenador do Nupiir, defensor público Lucas Colares, fala do choque de realidade e da ausência de direitos básicos que deveriam ser garantidos de forma imediata a esta população.
“Toda vez que entramos nas aldeias vemos que o problema é sempre maior do que pensávamos. A questão do início da cidadania, que é quando a pessoa começar a existir para o nosso sistema euro centrista de justiça, ou seja, através do registro civil, é a mais evidente. A maior parte dos indígenas, simplesmente não existe para nós, que lidamos sempre com números e estatísticas. E é, por isso, que estamos lá, para garantir que todas e todos possam ter seu registro, ter sua etnia na documentação”, explica o coordenador.
Além do atendimento presencial na Unidade de Dourados, o Nupiir leva o atendimento móvel a todas as comunidades do Estado. Somente em 2023, o núcleo já realizou quatro mutirões em seis aldeias diferentes. O ano de 2022 fechou com mais de 3800 atendimentos em terras indígenas e quilombolas.
O trabalho antropológico e presencial do Nupiir em comunidades indígenas de todo o Estado tem transformado a realidade de centenas de pessoas e se tornado referência em todo o país. Em setembro de 2022, por exemplo, a Defensoria de MS recebeu uma comitiva formada pelo, então, defensor público-geral do Mato Grosso, Clodoaldo Queiroz, pela defensora Maria Luziane, à época, secretária executiva da gestão, e a servidora Pâmela Watanabe, para apresentar o modelo de atendimento à população indígena com a Van dos Direitos.
Apesar de uma população indígena de cerca de 40 mil pessoas, Mato Grosso não possuía atendimentos focados nesse público. Para entender as principais dificuldades, a Defensoria vizinha acompanhou ações do Nupiir nas aldeias Bororó e Jaguapiru, ambas localizadas na reserva indígena de Dourados, cidade a 230 km de Campo Grande. A comitiva foi recebida pela defensora pública de Segunda Instância, Renata Gomes Bernardes Leal, gestora do Setor de Projetos e Convênios da Defensoria e pelo coordenador do Nupiir, defensor público Lucas Pimentel.
A efetivação de direitos a estes povos originários vai além da garantia de documentação. O Nupiir atua de forma hercúlea em áreas de demarcação.
A Defensoria de MS e a Defensoria Pública da União (DPU) conseguiram o relaxamento das prisões e apreensões de indígenas Guarani e Kaiowá durante retomada da fazenda Borda da Mata, que teria sido construída sobre o território de Guapoy, em Amambai, cidade a 355 km de Campo Grande. À época, o conflito entre indígenas, fazendeiros e equipe do BPChoque (Batalhão de Policiamento de Choque), resultou na morte a tiros, do Guarani Kaiowá Vito Fernandes, de 42 anos.
Na sequência, Defensoria de MS garantiu a soltura de três indígenas da comunidade Laranjeira Nhanderu, presos durante retomada em partes da Fazenda Inho, em Rio Brilhante, cidade localizada a 160 km de Campo Grande. O trio, de dois homens e uma mulher, foi solto pela polícia no dia seguinte, após atuação conjunta do coordenador Nupiir e defensores públicos que atuam em Rio Brilhante, Cássio Sanches Barbi e Alberto Oksman.
Os retrocessos no julgamento de demarcação de terras em todo o país, segundo publicação do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) tem motivado o clima de tensão entre fazendeiros e indígenas.
Em março deste ano, a Defensoria Pública de MS, em conjunto com o Ministério Público Federal (MPF) e a DPU divulgou nota pública em que manifesta a preocupação com o aumento da violência na disputa de terras entre indígenas e o proprietário da área denominada Fazenda Balneário do Tejuí, em Naviraí, cidade a 364 km de Campo Grande.
Conforme o coordenador do Nupiir, a região é reivindicada pelos povos Guarani e Kaoiwá como Terra Indígena Kurupi/Santiago Kuê. A área disputada é alvo do Compromisso de Ajustamento de Conduta firmado entre MPF e a Funai em 2007 e faz parte da Terra Indígena Dourados-Amambaipeguá II.
Neste dia Dos Povos Indígenas, a Defensoria destaca a força e a luta desta população para sobreviver e manter viva suas tradições em solo sagrado.
Dados - O censo demográfico de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), constatou que há no Brasil cerca de 817.963 indígenas. Desse total, 502.783 encontram-se na zona rural e 315.180 habitam os centros urbanos.
Mato Grosso do Sul concentra a terceira maior população indígena do Brasil, pouco mais de 80 mil pessoas de acordo com IBGE, representadas em oito etnias: Terena, Guarani, Kaiowá, Guato, Kadwéu, Kinikinaw, Atikun e Ofaié.
Segundo informações que estão no site da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), as reservas indígenas brasileiras ocupam 13,8% do território nacional. Em todo o país, são 1.170.579,17 quilômetros quadrados distribuídos em 566 terras indígenas reconhecidas.